quinta-feira, 14 de agosto de 2003

COMISSÃO DE RELAÇÃO EXTERIORES E DE DEFESA NACIONAL - Esclarecimentos sobre a política de concessão de vistos a trabalhadores estrangeiros no Brasil, a situação de brasileiros detidos em Portugal e nos Estados Unidos da América e o incidente com o avião francês em solo brasileiro.

Data: 14/08/2003
Sessão: 1145/03
Hora: 10h38

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Deputado Enéas, PRONA de São Paulo.

Espero que o nosso Ministro da Justiça guarde todas as intervenções brilhantes, porque infelizmente S.Exa. vai ter que respondê-las de uma vez só. Esta não é a norma da Comissão, mas estou procedendo assim em deferência ao Ministro da Justiça, que tem de ausentar-se dentro de poucos instantes.

O SR. DEPUTADO ENÉAS - Sra. Presidenta, estou marcando o tempo para não ser prolixo.

Sr. Ministro, V.Exa. é sobremodo conhecido, de forma que os encômios passam a ser dispensáveis.

Eu queria fazer uma pergunta específica, mas antes dela, e olhando para o relógio, é um comentário apenas en passant, testificando, ratificando a tese aventada, aduzida pelo meu colega sobre a tolerância que, na verdade, cresce, sem dúvida, e queria também acrescentar à sua brilhante alocução um fato recente, ocorrido em São Paulo, do qual o País inteiro é testemunha, no Hotel Danúbio. Por coincidência, morei 10 anos naquele hotel, tive residência lá, tinha uma suíte alugada o ano inteiro. O hotel foi desativado, e os proprietários o venderam a uma universidade. Qual é a minha surpresa quando uma secretária minha, que mora defronte, antes que o assunto fosse noticiado, liga para mim e diz: "Dr. Enéas, estão invadindo o hotel". Eram centenas de pessoas, e a polícia se manteve quieta. Ratifico que a minha intervenção somente faz eco à pergunta do meu colega. Até onde irá a tolerância? O Estado de Direito pressupõe que se respeitem direitos, mas também que continue existindo ordem, uma vez que, sem ordem, quero crer, não há nem direito. Uma coisa implica a outra.

Sra. Presidente, estou olhando o relógio, com todo o cuidado. Eu me preocupo, sim. Sou extremamente disciplinado. Não falarei mais que 3 minutos.

O SR. DEPUTADO JOSÉ THOMAZ NONÔ - E o Deputado Enéas tem um poder de síntese que ninguém tem neste País.

O SR. DEPUTADO ENÉAS - Obrigado ao colega. Mas vamos descontar os segundos que passaram. Falarei exatamente 3 minutos. Obrigado, Dr. Nonô. Esse é um tempo mais do que suficiente para se exprimir uma idéia.

Excelência, vivemos uma época, quero crer que não há dúvida quanto a isso, em que temas como prostituição, drogas, homossexualismo são apresentados quase que como variantes normais. Percebo que há, cada vez mais, não só tolerância, como aplauso. Preocupa-me isso. Quando eu digo preocupa-me, preocupa a mim e a 1 milhão e meio de pessoas que acreditaram em mim, numa votação isolada, falando pela televisão. A pergunta específica — e há uma consideração de natureza médica e filosófica que pressupõe a questão: quero crer, e não acredito que alguém possa contrapor-se à tese, que o corpo de cada um de nós não é propriedade da pessoa que o tem. Corpo e alma — e estou usando a palavra no sentido mais abrangente possível, de alma ou espírito — formam uma unidade indissolúvel. Nenhum de nós é dono do fígado e pode vendê-lo. Quando uma jovem, fruto de ruína, fruto do exício de toda a sua atividade como ser humano é obrigada a prostituir-se, ela não o faz porque assim o deseja. Se ela tiver 5, 10, 15 homens porque ela gosta disso, é um direito dela. Mas se ela vende o seu corpo, eu afirmo de cátedra, porque sou homem já vivido, ela não o faz porque assim o queira. Isso não pode, sob qualquer hipótese, a meu ver, ser visto como direito de venda, ou até com nota fiscal, como já se propôs. Eu tenho filhas e creio que todos as temos. Não consigo entender, nem aceitar, e brigarei a vida inteira contra isso. Claro que é necessário fazer uma reformulação gigantesca, é o que proponho e um dia talvez possa fazê-lo se chegar à Presidência da República: uma sociedade na qual não exista a necessidade disso, em que haja emprego. Para que haja emprego — aqui não é fórum para se discutir o tema — tem de haver produção, e para haver produção não se podem pagar juros extorsivos etc. É todo um conjunto de medidas que lamentavelmente não vejo serem tomadas. Mas dirijo-me a V.Exa., que é autoridade maior no terreno jurídico, e pergunto: o que V.Exa. pensa exatamente sobre essa questão? Na opinião de V.Exa., prostituição deve ser profissão ou não? Quero uma resposta sincera, como V.Exa. sabe fazer, diante do nosso grupo, que é de uma Comissão dirigida pela nossa Presidenta, que tem um cuidado extremo. Lembro que não citei nome de nenhum colega a não ser elogios ao Dr. Thomaz Nonô, que me precedeu.

Obrigado.

(...)

O SR. DEPUTADO FERNANDO GABEIRA - Sra. Presidenta, faço apenas uma precisão à intervenção do Deputado Enéas. Sou o autor do projeto que legaliza a prostituição. Trabalho com esse tema. Quero dizer que ninguém vende o corpo. Vendíamos o corpo no tempo da escravidão. As pessoas prestam serviços sexuais. Se a pessoa vendesse o corpo, ela virava escrava. (Risos.)

(...)

O SR. MINISTRO MÁRCIO THOMAZ BASTOS - (...) Ao Deputado Enéas, que me honra com a sua pergunta, quero dizer que uma parte da resposta foi dada quando respondi ao eminente Deputado José Thomaz Nonô. Em relação à prostituição, a minha posição é, em gênero, número e grau, idêntica à do Deputado Fernando Gabeira.

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