quarta-feira, 29 de outubro de 2003

COMISSÃO DE RELAÇÃO EXTERIORES E DE DEFESA NACIONAL - Exposição e debate sobre a condução da política externa do País.

Data: 29/10/2003
Sessão: 1810/03
Hora: 10h41

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Com a palavra o Deputado Enéas, do PRONA de São Paulo.

O SR. DEPUTADO ENÉAS - Senador José Alencar, primeiro, gostaria de trazer à lembrança o nosso encontro de 9 anos atrás. Profícua foi a conversa naquela ocasião. V.Exa. continua elegante, mantendo apreço, respeito e amizade pelas pessoas a que se refere e continua falando sobre o Brasil do modo pelo qual conduzimos a conversa naquela ocasião.

Era o ano de 1994, e tinha sido encerrada a eleição presidencial. Naquela ocasião, fui o terceiro candidato mais votado à Presidência da República do Brasil. No seu escritório, discutimos o sentimento misto de horror, indignação e tristeza de que eu era possuído e continuo sendo em relação a questões viscerais das quais padecem a nossa tão querida terra.

Tenho uma pergunta, mas antes um comentário. Sou absolutamente de acordo com as considerações que fez e faz sempre. Assisto a quase todas as suas exposições e locuções, em particular quando se refere às taxas de juros. Não existe absurdo maior.

No ano passado, foram 113,9, 114 bilhões. Este ano, um pouco mais. Não existe - estou plenamente de acordo com V.Exa. - economia alguma que resista a isso. Tudo o mais é conversa fiada, estou plenamente de acordo.

No decurso de sua locução, que foi também breve e rica, V.Exa. se referiu ao Chile e ao cobre - metal que agora começamos a descobrir no nosso território. É só uma lembrança, pois talvez alguns colegas não saibam que somos o maior produtor mundial de quartzo, que, com um grau de impureza de 10 elevado a menos 11, é vendido a menos de meio dólar o quilograma, e importamos chip de computador feito com quartzo a 3 mil dólares.

En passant, cito que na Pensilvânia, nos Estados Unidos, está o manganês. São milhões de toneladas que se foram daqui, e é fundamental pois é sulfurante, antioxidante para fazer aço.

Quando nós pensarmos, num futuro não muito distante, em fazer aço, vamos ter de importar manganês, porque agora grande parte dele se foi, deixando buracos no Amapá.

O último comentário sobre as riquezas colossais a que V.Exa. fez referência e que continuam a ser vendidas a preço de banana é da terra de V.Exa., de Minas Gerais. Lá está o nióbio - aliás, costumam dizer que sou vidrado em nióbio. É simples: sem nióbio não se pode construir aviões supersônicos. E o nióbio é vendido, mais ou menos, pelo preço de um cacho de bananas. É só uma lembrança.

Faço uma pergunta simples para V.Exa., a quem admiro e respeito. É sobre uma situação que não estou dizendo que vai ocorrer, mas que não é impossível, haja vista o exemplo da História do Brasil: se V.Exa. vir a assumir a Presidência da República do País, manterá a atual política mineral? Manterá a política de submissão às potências hegemônicas no que concerne ao pagamento de juros?

Muito obrigado.

A SRA. PRESIDENTA (Deputada Zulaiê Cobra) - Exmo. Sr. Vice-Presidente José Alencar, V.Exa. está com a palavra.

O SR. VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA (José Alencar) - Eminente Deputado Enéas, provavelmente a visita do Presidente ao Panamá, por ocasião do centenário do país, coincidirá com a viagem já agendada por S.Exa. à África. Por isso, solicitou-me S.Exa. que eu vá ao Panamá. Então, essa assunção à Presidência da República a que V.Exa. se refere, nesse período, parece que vai ser do Presidente da Câmara. Assim, aquelas medidas poderão ser tomadas por S.Exa. Temos de transmitir a S.Exa. essas perguntas. Fiquei muito honrado, Deputado Enéas, com a capacidade de memória de V.Exa. naquele almoço que tivemos em Minas Gerais, logo depois que trouxe ao País sua posição brilhante, na eleição de 1994. Se não tem ainda 9 anos, vai fazer agora. Recordo-me e digo que aprendi muito, porque V.Exa. é realmente um mestre.

Muito obrigado.


(...)

Quanto ao que o Deputado Enéas falou, temos aqui algumas colocações feitas por S.Exa. sobre 2 minerais: o quartzo e o nióbio. O Brasil é praticamente o único produtor e a sua maior produção encontra-se em Araxá, Minas Gerais. A exportação, parece-me, é de mais de 80% daquela mineração.

(Não identificado) - Com relação à produção, chegamos a 97%.


O SR. VICE-PRESIDENTE DA REPÚBLICA (José Alencar) - 97%? Então, é mais 80%. De fato, ele tem toda A razão. É aquilo que falei de forma mais macro, sem entrar em detalhes. Quando falei, por exemplo, em setor primário, apenas citei alguns segmentos desse setor. Não falei no setor ligado à mineração. Aí há vários itens ligados à mineração. O nióbio é um deles e o quartzo, outro.


Lembro-me da ocasião em que uma companhia japonesa queria fazer uma joint venture conosco para a extração de quartzo. Para quem não sabe, o quartzo é cristal de rocha. Ivan Botelho, meu amigo lá da Zona da Mata, dono da Companhia Força e Luz Cataguases Leopoldina, uma figura também muito conhecida, convidou-me para participar com ele daquele esforço para fazer a joint venture com os japoneses para a extração de quartzo. Fizemos um trabalho e fomos para Tóquio. Lá, os japoneses colocam uma mesa comprida assim, baixinha, onde eles ficam sentados de um lado e nós do outro lado e um nissei fazia a tradução. Eles, então, fizeram uma pergunta, e nós a respondemos. Eles trocaram idéias entre si, por bastante tempo e em japonês, pois é assim que eles negociam. Depois eles falavam com o nissei, para que ele fizesse, então, a tradução. Pensei: bom, vão dar uma resposta a nossa colocação. Eles fizeram uma outra pergunta. Nós ficamos ali umas 3 horas respondendo a perguntas e, no fim, eles nos informaram que a General Electric americana havia desenvolvido uma tecnologia do quartzo sintético. Eles se utilizavam de pedras pequenas de quartzo, transformavam aquilo em pó e faziam uma prensagem. É um aglomerado de quartzo que servia como isolante - o quartzo é usado como um grande isolante na eletrônica. Eles falaram que aquilo estava superado. Depois de 3 horas de discussão, o negócio acabou ali. Agora V.Exa. traz informações valiosas em relação ao quartzo.


Temos de examinar cada item da nossa economia, e o quartzo é uma delas. V.Exa. pode, com o seu conhecimento, trazer uma grande contribuição. Caso V.Exa. tenha algo escrito a respeito do quartzo ou do nióbio, comprometo-me a levar ao Presidente Lula e, obviamente, chegará ao Ministério de Minas e Energia. Precisamos aproveitar a contribuição de todos os brasileiros, especialmente daqueles que têm tanto a oferecer, como é o caso de V.Exa.

quinta-feira, 23 de outubro de 2003

Inocuidade do Estatuto do Desarmamento na redução da criminalidade no País. Críticas às propostas de reforma previdenciária e tributária encaminhadas pelo Poder Executivo

Data: 23/10/2003
Sessão: 239.1.52.O
Hora: 14h54

O SR. ENÉAS (PRONA-SP. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, a impressão que tenho, a cada novo projeto, a cada medida provisória que se apresenta nesta Casa para votação, é a de que devo estar sonhando.

Inclusive há pouco vi o ilustre Deputado Jair Bolsonaro ficar indignado, até ultrapassando os limites do seu comportamento normal.

É fundamental que acordemos para o fato claro como a água de rocha, límpido como o liquor de uma pessoa que não tem meningite: esse projeto que aí está não resolverá coisa alguma. As mortes por acidente de pessoas que portam arma de fogo e não são delinqüentes correspondem a um percentual irrisório, desprezível, quando se leva em conta a verdadeira mortandade que ocorre nas grandes metrópoles e até em cidades do interior. Os delinqüentes, sejam assaltantes, sejam estupradores, não têm armas registradas.

Chega a ser risível para qualquer um de nós, que temos o mínimo de lucidez intelectual, sermos obrigados - por educação, todos somos obrigados a ouvir - a ouvir os discursos dos que defendem esse projeto eivado de retóricas, como se a imbecilidade generalizada dominasse nossas mentes. Olhemos para São Paulo e Rio Grande do Sul e vejamos a quantidade de homicídios nesses 2 Estados da Federação. É muito maior em São Paulo, no entanto, o Rio Grande do Sul é muito mais armado. Os dados estão aí para quem quiser vê-los nas delegacias de polícia.

No Brasil como um todo, Sr. Presidente, há armas em lares num percentual máximo de 5%. Nos Estados Unidos o percentual é de 48%.

Se olharmos para os países desenvolvidos, vamos perceber a estupidez suprema que é desarmar a população, que passará a não ter nem o direito de se defender, contrariando princípio constitucional. Isso é aplaudido e se repete em verso e prosa, mas não representa avanço nenhum, é mais um retrocesso. Entrega-se o cidadão, que não tem mais o direito de se defender, nas mãos de quem entrar na sua casa para fazer o que quiser. É o absurdo dos absurdos!

Sei que já perdemos, os que lutam contra o projeto já perderam, mas é apenas o que os eleitores esperam ouvir. As pessoas que estão do lado de fora dizem assim: "Pelos céus, pelo menos reclamem, pelo menos digam que estamos sendo enganadas". Saiba a população brasileira que foi enganada na reforma da Previdência. Não estou agredindo ninguém em particular, mas me referindo a um modelo pútrido, hediondo, em decomposição, que se repete e é igual ou muito pior do que era antes.

Vamos ser honestos! Vamos parar com essa hipocrisia! Vamos parar de dizer que estão defendendo a população! A troco de que tanta mentira?

Tenho essa posição e não estou ligado a nenhuma outra estrutura política. Criei o PRONA e defendo essas idéias, como todos sabem, há 14 anos. É preciso parar com a hipocrisia e aprender a dizer a verdade. Só a verdade pode fazer com que a população acredite em quem está falando, como acredita em mim, que jamais, em nenhum instante, por 14 anos, me contradisse.

A reforma da Previdência, a prorrogação da CPMF e da DRU foram uma punhalada pelas costas. A população está sendo a todo instante vilipendiada, enganada. Quando um colega se levanta contra isso, como fez o ilustre Deputado Jair Bolsonaro, e diz, utilizando linguagem - considero eu - um pouco rígida, talvez despida de figuras de sintaxe ou retórica, mas sincera, tudo o que estou expondo, é imediatamente atacado, porque não pode escolher seu tipo de linguagem. Mas se trata de um Parlamentar que tem direito de se expressar como achar conveniente.

À população brasileira que por acaso estiver nos ouvindo, informo que esse projeto não resolverá coisa alguma nem melhorará a situação. Os assaltantes ficarão cada vez mais felizes, porque agora, sim, no sinal de trânsito ou em qualquer outro lugar - eles sabem - não haverá defesa.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

quinta-feira, 9 de outubro de 2003

Transcurso do Dia Mundial do Coração. Comemoração dos 25 anos da Fundação Zerbini/INCOR e dos 60 anos da Sociedade Brasileira de Cardiologia.

Data: 09/10/2003
Sessão: 217.1.52.O
Hora: 11h18

O SR. ENÉAS (PRONA-SP. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, colegas médicos, cardiologistas, médicos de outras especialidades, Deputados, existe um livro pequeno, na verdade um opúsculo, de Lewis Carroll, que tornou conhecida, por toda a população do planeta, a figura de Alice. Refiro-me a Alice no País das Maravilhas e Alice no País do Espelho. Há um certo trecho, que todos lemos, em que Alice está numa encruzilhada e há 2 caminhos, dentre os quais tem de escolher um, e ela pergunta para a imagem de um gato que se configura na esquina: "Diz-me, gato, qual o caminho devo seguir?" E a imagem do gato responde: "Depende de para onde tu queiras ir". Ela diz: "Eu não sei para onde quero ir". O gato responde: "Então, qualquer caminho serve".
 
Contei rapidamente a história para dizer aos colegas Parlamentares e àqueles que neste horário estejam assistindo à sessão que a cardiologia sabe o seu caminho, não tem esse problema da figura inesquecível de Alice, sabe exatamente o que faz. E seria despiciendo tecer mais uma série de encômios a instituições tão conhecidas, respeitadas e respeitáveis como o Instituto do Coração e a Sociedade Brasileira de Cardiologia.

Prefiro citar para os colegas médicos, Deputados e aqueles que assistem à sessão alguns pontos fundamentais em qualquer atividade científica. Um deles é a coragem para enfrentar o desconhecido, para desenvolver técnicas novas. Isso ocorre desde a antigüidade. Se Versálio não tivesse tido coragem, talvez até hoje não soubéssemos anatomia, porque ele roubava cadáveres para dissecá-los. É necessário coragem, como teve, por exemplo, o primeiro homem que pôs um cateter na veia e foi até à sala de raios X para ver o cateter no coração. Enfim, a característica precípua é ter coragem. É fundamental ter esmero, dedicação e obstinação — sem isso não se anda —, em qualquer atividade, precipuamente na científica, objeto da homenagem de hoje.

Outra característica importante é ter rigor, esmero, cuidado, inclusive na linguagem. Nós, cardiologistas, médicos, Deputados, temos de ter cuidado quando nos exprimimos para não cometermos cincas imperdoáveis, erros crassos, que fazem até muita gente rir.

Confúcio, certa feita, interrogado por seus assessores, há muito tempo, 2 milênios, disse: "Se o que eu digo não é o que pretendo dizer, o indivíduo que está me ouvindo não entende; não sabe o que tem de fazer". Se aquilo que deve ser feito não o é, a moral e as artes decaem. Se a moral e as artes decaem, o povo é entregue à confusão. É mais ou menos um retrato do que se passa, em grande escala, em muitas esferas do Poder em nosso País.

Para concluir, quero dizer aos meus colegas médicos e Deputados e àqueles que assistem à nossa alocução que Sócrates andava, certa feita, pelas ruas de Atenas — ainda não era filósofo renomado, mas um ser humano como qualquer outro —, com um daqueles que seriam posteriormente seus discípulos, se não me engano Trasímaco, e, ao passar perto de uma pitonisa, de uma sibila, perguntou: "Quem é o homem mais preparado, mais sábio do mundo?" E a pitonisa disse: "Este que está do teu lado, é Sócrates". Sócrates disse: "Mas eu sei que nada sei". E ela disse: "Nisso reside tua sabedoria".
 
Sócrates ficou perturbado e saiu pelas ruas de Atenas perguntando: "Será que é verdade? As pessoas pensam mesmo que sabem?" E perguntou ao primeiro general que passava: "Diz-me, tu que és um General, o que é a coragem". O General disse: "Coragem é atacar o inimigo". Sócrates argumentou que nem sempre; às vezes é preciso recuar para uma posição estratégica. Isso não quer dizer falta de coragem. O General, que era um homem lúcido, aquiesceu e disse: "É verdade". E Sócrates fez-lhe a pergunta novamente. E o General deu outra resposta. E Sócrates mostrou que não era, e foi um ir e vir de perguntas e respostas. Ao final de tudo aquilo, o General ficou irritado e disse: "Pronto, eu não sei, eu não sei o que é coragem, diz-me". Sócrates: "Mas eu não disse que sabia. Vamos, nós dois juntos, procurar a verdade". Nasceu a maiêutica.

Muito obrigado, Sr. Presidente. (Palmas.)